O twitter obsessivo, misógino e anti-feminista dos membros da IL

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Estamos numa época em que partidos populistas (assumidos ou não) de direita têm no seu ideário político o combate ao feminismo – o mesmo é dizer o combate aos direitos já adquiridos pelas mulheres, o repúdio de reivindicações das mulheres ainda não alcançadas (como igualdade salarial, efetiva igualdade de oportunidades, fim da exclusão dos lugares de poder político e económico, e mais umas tantas, para não referir as sempre presentes ameaças pairando sobre as nossas cabeças da violência doméstica e violência sexual) e a desvalorização de todas as discriminações desfavoráveis às mulheres existentes numa cultura machista. Importa, por isso, fazer finca pé aos partidos políticos pela adoção das medidas que eliminem distorções provenientes das normas sociais e culturais e, por outro lado, denunciar aqueles que combatem os direitos das mulheres e a igualdade de oportunidades.

Ora surgiu há pouco tempo a Iniciativa Liberal – que apesar de ter liberal no nome, e de inicialmente prometer alguma mudança, afinal se situa na direita mais conservadora e mais defensora do status quo em se tratando de questões de mulheres – que vêem feminismo como, no mínimo, diabólico. Lateralmente ao afunilamento de ideias apenas para as questões económicas, fazem um endeusamento do mercado e pugnam pela permanência das distorções existentes. Já aqui referi as estranhas ideias que têm sobre licença de maternidade e mães no mercado de trabalho. Ou a obsessão de uma senhora da IL (que foi a segunda da lista às eleições europeias) para não reconhecer a menor propensão das mulheres políticas para a corrupção. No Observador escrevi como a única intervenção estatal que patrocinam no tema mulheres é facilitar que nos tornemos prostitutas. Agora trago-vos uma série de tuits de pessoas com responsabilidades na IL (não o apoiante anónimo das redes sociais, ou as muitas contas recentes e com poucas dezenas de seguidores que fazem assédio ou aplaudem em prol da IL) que mostram o tipo de mindset sobre as questões de direitos e oportunidades das mulheres e de feminismo. São úteis para percebermos como estas pessoas são hostis – em alguns casos descabeladamente e obsessivamente e patologicamente hostis – a todos estes assuntos.

E esta é somente uma pequena amostra, obtida por conversas que tinha guardado ou por pesquisa de palavras chaves nas várias contas de alguns selecionados.

Comecemos com o presidente da IL, Carlos Guimarães Pinto. As feministas são histéricas (e se o mundo desvaloriza problemas importantes não é porque o mundo seja idiota e não consiga separar a mensagem do mensageiro, não, é culpa nossa que somos histéricas). O feminismo no Ocidente é algo desnecessário (como sabemos não somos violadas e abusadas, nem há 20 mortas por violência doméstica este ano em Portugal, nem uma justiça que está perto de glorificar agressores, nada disso – e se ganhamos menos e estamos menos nas empresas, é porque somos comparativamente más profissionais). As quotas só são defendidas por mulheres incapazes (enfim, persignemo-nos perante a idiotia e a ignorância e a burrice ilimitadas). As feministas fazem slutshaming. A roupa das mulheres propicia violações (juro que escreveu esta canalhice). Falar de uma criança vítima de violência doméstica é aproveitamento político. Bom, as pérolas são intermináveis, incluindo discussões afirmando que os homens têm mais desejo sexual que as mulheres e que tal está cientificamente provado (bom, nem comento).

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O meu preferido: é sexismo descrever a realidade sobre as vítimas e os agressores de violência doméstica. Presumo que como não podemos reconhecer razão em nada que as feministas aleguem, temos de fingir que as vítimas e os agressores têm um perfil aleatório, todos caladinhos quanto ao facto de os agressores serem na esmagadora maioria homens e as vítimas quase sempre mulheres.

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Avancemos. Catarina Maia, uma das mais destacadas (e poucas) mulheres da IL. Listas só de mulheres? Monocultura. Mas grupos só de homens? Nada garante que não sejam diversos. Gender wage gap é uma invenção política. Tudo é culpa das mulheres no mercado de trabalho: pouco assertivas, se não estão lá é porque não cabemos na meritocracia (e para a IL a bitola das mulheres é vivermos efetivamente numa meritocracia; para o resto, assevera a IL, vivemos numa sociedade que não liga ao mérito e só os familiares e amigos do PS singram; em resumo: não existe meritocracia para nada, exceto em se tratando das mulheres, onde há uma excelsa avaliação impoluta e imparcial do mérito – que, alás, nos falha; lógica imbatível). Supremo insulto: esta vossa amiga que vos escreve defende um odioso ‘feminismo de género’ (não faço ideia do que é).

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Pedro Antunes, membro da IL da primeira hora, afirma carregado de autoridade que a defesa dos direitos das mulheres que aqui a yours truly faz são só clichés. Isto apesar de reconhecer que não percebe patavina do assunto (mas, claro, continua carregado de autoridade). Atenção: quer resolver os problemas – aqueles que assumem na IL que existem, que, como se comprova, é nenhum.

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Dando um pulo do twitter até ao facebook. Recordam-se daquele texto reles que uma senhora de uma tendência ultraconservadora do CDS escreveu, atacando as pretensões das mulheres de terem uma carreira e remetendo-as exclusivamente para a esfera da maternidade, do casamento e do cuidado da casa? (E atacando as quotas, claro, e as feministas.) Vicente Ferreira da Silva, que inclusive participou na elaboração do programa para as próximas eleições da IL, adorou o texto. Achou magnífico, partilhou no seu facebook, delirou. E até aldrabou que o texto era apenas uma forma de dar liberdade de escolha às mulheres de escolherem casa e filhos (liberdade de escolha essa absolutamente ausente do texto, que fala de outras coisas, e que não está em risco em algum lado).

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E agora chego ao caso patológico, clínico, a necessitar de tratamento com urgência, de um senhor que tuita obsessivamente e compulsivamente sobre feminismo. Acredito mesmo que acordará todas as noites aos gritos com os pesadelos que terá com as diabólicas feministas que somos nós. É uma pessoa de grande argúcia intelectual – tão grande que praticamente a sua comunicação se resume a memes com graçolas invariavelmente imbecis. Escorre ódio por todos os lados. Mulheres políticas como Hillary Clinton e o feminismo e as feministas são repetidamente representadas como equivalentes aos nazis ou ao Ku Klux Klan (nada menos que isso, vejam lá!). Somos ‘ladroagem’. Somos nós as opressoras. Um homem que comunica através de memes acusa as feministas – que têm um enorme manancial de pesquisa que as apoia – de não fundamentarem o que argumentam. Enfim, a indigência intelectual é tanta que custa a acreditar que é uma pessoa real – mas é. António Costa Amaral, dos órgãos dirigentes da IL nesta última direção. Este senhor tem uma serventia (alguma haja): é um argumento imbatível do delirante e compulsivo ódio misógino que persiste na sociedade (e na IL) e da grande necessidade de existir um discurso feminista.

 

Piora, porque é daquelas pessoas que só liga o que quer que seja à violência sexual quando se trata de a usar como arma de arremesso contra a esquerda (ou os islâmicos). Porque, para as outras ocasiões, claro que tem a reles argumentação de as acusações de violação serem com frequência falsas. Em suma, é um relativizador da violência sexual se for perpetrada por homens brancos de direita.

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Bom, depois desta avalanche de loucura deste último exemplar, deixo aqui o sentido de humor (a.k.a., a opinião sentida) de João Cunha, outro IL desde cedo. Enjoy. E votem bem.

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Mãe de dois rapazes e feminista (das duas características conclui o leitor inteligente que não quer exterminar os homens da face da Terra). Licenciou-se em Economia ao engano, é empresária, mas depois encarreirou para os Estudos Orientais, com pendor para a China. É cronista do Público e escreve ocasionalmente ensaios sobre livros e leituras na Ler. Já foi blogger e cronista do Observador e Diário Económico. Considera Lisboa (onde nasceu e vive) a cidade mais bonita do mundo, mas alimenta devaneios com Londres e Hong Kong.

2 COMENTÁRIOS

  1. “o mesmo é dizer o combate aos direitos já adquiridos pelas mulheres” — não me pareceu ler, no meio daquela confusão de memes e print-screens, nenhuma referência implicasse recuar nos direitos iguais já alcançados.

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