Neste Dia Internacional da Mulher as perspetivas são funestas. Depois de dois anos de pandemia, que trouxe uma pioria generalizada na situação das mulheres – mulheres (e crianças) fechadas em casa com agressores domésticos durante os confinamentos; aumento da pobreza por todo o lado do mundo (e a pobreza é tendencialmente mais feminina que masculina); carga doméstica com filhos com aulas em casa a recair sobretudo sobre elas, com todo o aumento de cansaço e stress que daí advém; em Portugal, 90% dos empregos destruídos pela crise da pandemia eram de mulheres; os pedidos de assistência à família vieram maioritariamente das xx, com as consequências profissionais que daí resultam e mostrando as divisões de papeis familiares ainda tão entranhadas e com desfavor para elas; sem surpresa com tudo isto, as diferenças salariais entre homens e mulheres subiram de 10,9% em 2019 para 11,4% em 2021; a saúde mental das mulheres foi particularmente afetada; um quilométrico etc. -, vem agora uma guerra e toda a incerteza e perigos para as mulheres que estes eventos geram.
Na Ucrânia, invadida pela Rússia de Putin, começam já a surgir histórias de violações de ucranianas pelos soldados russos nas zonas ocupadas. É certo que estas acusações de violações de ucranianas por russos podem fazer parte da estratégia comunicacional da Ucrânia para gerar simpatia internacional (o ministro dos negócios estrangeiros ucraniano já as referiu) e serem falsas ou empoladas. Sucede, infelizmente, que o MNE ucraniano não é o único a falar destas violações. Por outro lado, violar mulheres é um hábito de guerra bastante arreigado; aconteceu no Kosovo nos anos 90, no Sudão do Sul mais recentemente, há inúmeros relatos de violações de mulheres rohingya na Birmânia. Não custa acreditar que aconteça novamente. Tanto mais que a guerra russa se tem dirigido diabolicamente contra a população não militar: bombardeiam civis, bombardeiam casas, escolas e hospitais, não permitem a evacuação de civis para fora das zonas de combate, é uma guerra de atrocidades para causar o maior sofrimento possível. Violações de mulheres inserem-se facilmente nesta guerra de terror. Na Ucrânia está o grupo Wagner, composto por mercenários associados a violações noutras zonas do mundo por onde passaram. Por fim, existem acusações de violações pelos separatistas russófilos do Donbass nos últimos anos (aqueles que fizeram despenhar um avião malaio cheio de pessoas inocentes).
As mulheres que saem da Ucrânia (e só saem mulheres e crianças e adolescentes) também não estão a salvo. As redes de tráfico de mulheres para exploração sexual já se prepararam para se aproveitarem do desespero alheio das refugiadas ucranianas para disso fazerem negócio. As mulheres refugiadas, note-se, estão normalmente muito expostas a violência e exploração sexual, incluindo nos campos de refugiados. É perpetrada pelos organizadores das rotas das viagens, pelo staff dos campos de refugiados (muitos deles trabalhando para as melhores organizações), pelos outros refugiados homens. A exploração sexual é também endémica, muitas vezes exigindo-se sexo em troca de proteção, alimentos, medicamentos, acesso aos países de destino ou aos campos/abrigos.
Uma vez que a vaga ucraniana de refugiados será composta por mulheres e raparigas, sobretudo, e rapazes menores, o que nos resta fazer é exigir que as políticas europeias para responder aos problemas das refugiadas, com uma grande atenção a esta perspetiva de género. E esperar por Dias Internacionais das Mulheres mais promissores.