True Colors, de Cyndi Lauper, lançado em 1986, é uma das canções da minha juventude. Ainda é, na minha carne mais maturada.
Na altura, aquela figura feminina enigmática, de cabelo despenteado, às cores, aquele batuque inicial e final, transportava-me para um mundo desconhecido e fascinante, tinha 16 anos:
“But I see your true colors
Shining through
I see your true colors
And that’s why I love you
So don’t be afraid to let them show
Your true colors
True colors are beautiful
Like a rainbow”.
True Colors. Mostram-se, particularmente, em situações de crise. Para o bem e para o mal. Não sou tão otimista como a Cyndi Lauper. Nem sempre são bonitas, nem sempre se encontram tesouros para além do arco-íris. Nem sempre somos cor.
Vivemos num momento em que a escolha individual, em que o debate pelos direitos, liberdades e garantias está ao rubro, em que posições se extremam, em que amizades, apesar de tentarmos que não, vão sendo picadas com agulhas até rebentar o balão, um ferrão ali, outro acolá, em que a conta-gotas ou num só dia, pessoas vão abandonando grupos de amigos no WhatsApp porque têm posições opostas, não se entendem, ofendem-se ou não lhes faz sentido continuar com diálogos e conversas que lhes tocam nos nervos ciáticos.
Sim. Falo sobretudo de questões ligadas à vacinação e às medidas que vão sendo tomadas para controlo da pandemia, que vivemos numa ditadura, restrições à liberdade, atropelos de direitos e garantias, de um total controlo da população pela ordem mundial vigente. E pergunto-me se a ordem mundial vigente, se as cores político-partidárias vigentes fossem diferentes, se o controlo, o atropelo às liberdades, direitos e garantias seriam diferentes. Não sei, sinceramente. Por esse mundo fora, em particular na Europa, as medidas de controlo da pandemia, na sua generalidade, mais cedo ou mais tarde, seja qual for a cor política, convergem.
O vírus que nos abalou a vida, não afeta só a saúde, afeta tudo. E afeta, também, as amizades. O que é triste.
Para mim, sempre foi uma questão de saúde pública, de tomar as decisões que me pareceram mais certas pelo bem comum. Independentemente da cor vigente. Talvez porque estou a passar a pandemia fora de Portugal, não viva tanto o quotidiano como vivem os meus conterrâneos. Apesar de sempre atenta, apesar de onde vivo as restrições também existirem e até terem sido mais duras das que foram em Portugal.
Para quem vive fora do Pais, as cores são importantes. De saber de cores, precisa quem vive no estrangeiro e de viajar. Para saber se é possível ir a Portugal ou se não, se é necessário fazer PCR ou se o Antigénio basta, se tem que se fazer quarentena à chegada ou no regresso. O mapa de cores assim o determina. Vou fazer o quê, neste momento? Comprar aguarelas e pintar por cima? Desenho nunca foi o meu forte.
No artigo The Return of Cyndi Lauper, publicado no New York Times, no mesmo ano de 86, cito: ”We think we can see the light at the end of the tunnel,” Lauper says, sunglasses hiding her bleary eyes. ”The trick is to pick the right tunnel.” Cada um tem escolhido o seu caminho. Certo. Mas que não seja pelas cores partidárias que cada um defende. Calhou a este, calhou a estes que estão no poder por esta Europa e por este Mundo fora estarem à frente das decisões politicas, em tempos pandémicos. Sim. É verdade. Este é, também, um vírus político. O controlo da pandemia tem sido um mundo de politiquices, de decisões incompreensíveis e de lutas pelo poder. Mas a minha decisão de ser vacinada, continuar a usar máscara, evitar ajuntamentos não é reflexo de falta de pensamento critico, de liberdade de pensamento ou de formatação não sei bem de quê. É resultado destes aliás. E a expressão da minha opção político-partidária será feita numa assembleia de voto. Se não estenderem o braço para ser vacinado(a)s, levantem, então, o rabo quando for a altura de ir votar. Em quem bem entenderem. Que se proteste, que se denunciem situações comprovadamente abusivas. Não espalhem é o vírus, o propriamente dito. Esse não escolhe nem cor, nem idade, nem género. Nem a desinformação. Ou isto nunca mais terá fim.
Imagem: Instalação “Origami for Life”. Mais de 20000 pássaros de papel, uma obra artística participativa criada durante o primeiro confinamento, em março de 2020. Por cada origami criado, uma contribuição financeira de patrocinadores apoiou a pesquisa científica na luta contra a Covid-19. Musées Royaux des Beaux-Arts de Belgique, Bruxelas.