Os trolls online são psicopatas – diz a ciência

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Retrato de Maria João Marques pela Artie's Drawings.

Sou uma pessoa simples. Na minha vida – em qualquer capacidade – estão só pessoas que me apreciam, que mostram que me apreciam, que me tratam bem; nunca fui fã de contabilidade (algo muito aborrecido), mas aqui a linguagem contabilística é útil: só mantenho pessoas que me tragam um saldo positivo. Uma das mais úteis aprendizagens da vida é sabermos afastar-nos de pessoas tóxicas, das que nos maltratam, das que nos dão a informação – por palavras, atos e omissões – que não valemos e não prestamos, das desleais, das que nos deixam pendurados, das que nunca têm em conta as nossas necessidades, das que nos ocupam o tempo com os seus rodopios e assuntos e querelas e conversas que nada acrescentam.

Isto transpõe-se tal qual para as relações online, a maior parte das vezes com desconhecidos. E aqui é um panorama desolador, não só pelo assédio – mas, sobretudo, pelo estado psicológico penoso das pessoas (que o praticam) que o assédio online conta.

O que leva alguém a ter necessidade de interagir com um desconhecido para o informar que é uma nulidade, não percebe nada, só tem opiniões por ressabiamento pessoal, se tem alguma visibilidade é porque dorme com alguém que lha dá, que é falho de inteligência, que não tem qualidades, que tem as hormonas descontroladas, que… que… que…? Que disfuncionalidade provoca em alguém a necessidade patológica de permanentemente perseguir outra pessoa – que não conhece – para a importunar? Por que carga de água alguém inventa mentiras sobre outros ou coloca palavras falsas na sua boca (ou no seu teclado)?

Não se pode fugir do costume: pessoas felizes e equilibradas não precisam de tentar pôr outros para baixo, não tiram nenhum prazer de incomodar os demais. Não é indício de grande saúde mental a compulsão com que desconhecidos agem com amigas minhas ou comigo, indo escavar informações sobre trabalho, família, expondo no twitter, enviando ameaças, escrevendo contas falsas sobre nós (para o que bebem religiosamente cada palavra que escrevemos), insultando, permanentemente comentando venenosamente, às vezes em conversas insultuosas entre si de contas anónimas evidentemente falsas. Consideram-se tão no direito de importunar – e vêem de tal modo os seus alvos como passivos patinhos que se deixam maltratar – que depois de desamigar alguém inconveniente no facebook, a maioria das vezes recebo uma mensagem do excluído logo de seguida. (Como se fosse sequer abrir e ler mensagens de quem me quer mal. Como se eu tivesse obrigação de aceitar os termos de comunicação de terceiros.) É tão recorrente que passei para os blocks imediatos.

Não há, incrivelmente, muita pesquisa sobre este assunto, mas a que há, sem surpresa, revela níveis grandes de sadismo e falta de empatia efetiva e psicopatia e narcisimo nos abusadores online. São pessoas de qualidade ruim e, tal como na vida não digital, devemos assegurar que mantemos a distância. Em todo o caso, é preocupante que tantas pessoas (e são sobretudo homens) demonstrem estas disfuncionalidades. Uma comunidade saudável não se constrói com pessoas doentes e doentias. Uma sociedade com este nível de psicopatia e sadismo não tem futuro catita.

As redes sociais são fenómenos muito recentes e ainda não sabemos lidar com elas de forma salutar. Lá chegará o tempo. Também me recordo dos vícios em televisão e em telelixo que existiam há décadas, e como certos espetadores menos escolarizados eram mais suscetíveis à má televisão. Porém nada impede de acelerarmos a aprendizagem. A miudagem, nas aulas de Cidadania, devia tratar destes temas: os comportamentos dos trolls e dos cyberbullies, os efeitos destas personalidades no debate público – o afastamento de pessoas do debate, a misoginia, como o bullying mais corrosivo cai em cima das mulheres com visibilidade, dos negros, dos homossexuais ou de outras minorias, a forma como muitas pessoas se inibem de opinar nas redes sociais ao sofrerem bullying ou verem cair em cima de terceiros, o afunilamento do debate nos temas permitidos pelos trolls, a constante acrimónia do debate -, os efeitos nos alvos, a legislação, a ética (ou falta de) nestes comportamentos, os casos mais paradigmáticos. Acima de tudo: aprender que liberdade de expressão não se confunde com ódio online.

E, claro, estratégias de resposta. Bloquear pessoas é muito eficaz. Ultimamente tenho-me dedicado a fazer denúncias às plataformas correspondentes quando vejo comportamentos abusivos sobre qualquer pessoa. No facebook nunca tive nenhuma resposta decente (só imagens de mamas os incomoda), nem quando trolls divulgaram de forma insultuosa uma história bem disposta com um dos meus filhos que lá contei, mas o twitter dá mais resposta. Denunciar publicamente o assédio que nos fazem – nunca devemos deixar descansados fora da censura pública quem nos persegue (embora seja impossível expor todos, não escreveríamos mais nada). Sobretudo perceber que os trolls são assim pelas deficiências próprias – sadismo, narcisismo, psicopatia, falta de empatia – e não por defeitos dos seus alvos. E por isso devem ser gozados sem contemplações. A função da censura social dos comportamentos de assédio online. Além, claro, da regra de ouro para tudo na vida: fazermo-nos acompanhar das pessoas que gostam de nós, não nos falham e nos protegem militantemente dos mal intencionados.

 

(Na imagem um retrato meu que o autor da última conta falsa, supostamente minha, entendeu roubar do meu twitter, evidentemente sem autorização minha ou dos autores, os Gémeos Colaço e a Catarina Lira Pereira.)

 

 

 

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