The winner takes it all?

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O vencedor fica com tudo? Devemos tentar vencer? Ser sempre os melhores?

A julgar pela quantidade de livros, palestras e workshops sobre o tema, e também pelo que se ouve nas conversas comuns, parece que ganhar é “a coisa” e que todos devemos ser vencedores. Até li um artigo que dizia que as relações são jogos de poder e se não o soubermos vamos perder. E sim, algumas relações são jogos de poder. Mas são mesmo essas as relações em que queremos estar? Se queremos ganhar até ao nosso parceiro, onde poderá ser o repouso do guerreiro?

Os relacionamentos interessam-me e as relações de poder também. Se medíssemos numa escala vítima/agressor, ficaria mais vezes no lado da vítima. Interessa-me saber como posso deixar de ser vítima sem me tornar uma agressora. Porque quero acreditar que há outras possibilidades.

Apesar de acharmos que somos especiais dada a nossa racionalidade, isso deve-se sobretudo à falta de informação sobre o funcionamento do nosso cérebro. Se soubéssemos mais sobre ele, saberíamos o quão pouco funcionamos a partir do nosso ‘cérebro racional’ e o quanto funcionamos a partir da zona do cérebro mais antiga, que partilhamos com os répteis.

Para perceber isso sugiro um exercício simples que consiste em ir ao facebook e voltar. Ou uma viagem rápida ao mundo da política, da moda, do futebol ou outro qualquer da vossa preferência.

Frequentemente as pessoas normais ficam chocadas umas com as outras. Algumas mais atentas até ficam chocadas consigo próprias – a essas dou os parabéns. Quando olhamos para o ser humano esperando que seja apenas ou pelo menos maioritariamente racional, é inevitável o choque.

A razão desse choque e incompreensão deve-se principalmente a que, no nosso percurso de aprendizagem, aprendemos mais sobre as capitais da Europa e a tabela periódica do que como funcionamos como seres humanos.

Não é de estranhar uma vez que conhecermos-nos melhor nos dá poder e a educação formal não está focada em nos dar esse poder. É interessante saber que a educação pública gratuita e obrigatória tal como a conhecemos, surgiu na Prússia, pouco após a revolução francesa e que a sua intenção era impedir que outras revoluções pudessem acontecer. A sua estrutura fomentava a disciplina, a obediência e o regime autoritário. Procuravam um povo dócil que participasse nas guerras obedientemente. Destinava-se a preparar, não cidadãos, mas sim súbditos.

Uma escola que fomenta a competição é perfeita para impedir que os cidadãos se unam para decidir sobre a sua própria vida. Porque imaginem como seria uma democracia de pessoas com respeito por si e pelos outros mas sem medo da autoridade? Uma democracia de pessoas capazes de cooperar e fazer escolhas informadas e conscientes?

Passámos durante anos a maior parte do nosso tempo acordado na escola. Numa escola que ainda segue maioritariamente o modelo Prussiano. Será de estranhar que seja tão comum a eleição e obediência a tiranos? Os tiranos são uma minoria, o seu poder resulta de todos os que os alimentam na esperança de serem privilegiados. Lembram-se do chefe de turma? Aquele que escrevia no quadro o nome dos colegas que se portavam mal na ausência do professor?

Como mamíferos gregários, temos necessidade do grupo para nos sentirmos seguros. Sem grupo temos medo e o medo despoleta a agressão. Podemos tirar o Humano da tribo, mas não podemos tirar a tribo do Humano. Na tribo vivíamos rodeados por pessoas que conhecíamos e em quem confiávamos, os recursos eram distribuídos equitativamente por todos e um dos crimes mais graves, punido com a morte ou com exclusão, era a ganância: querer uma maior parte do que os outros. Na tribo os desconhecidos podiam ser uma ameaça e a tribo era a garantia de sobrevivência. Nas tribos atuais que são as religiões, os partidos, os clubes, esse senso de necessidade de que a nossa tribo seja a mais forte, os extremos a que chegamos para a defender são recordações da forma como o nosso cérebro funciona. Quando funcionamos a partir do no nosso cérebro primitivo vemos todos como aliados ou opositores: é o modo guerra que ainda domina a maior parte do mundo.

O nosso sistema nervoso tem dois modos, um de conexão e outro de desconexão. Conexão com os que nos deixam seguros, a nossa tribo; desconexão com os que não pertencem a ela. Essa desconexão provoca medo, o medo provoca violência. Para reduzir a violência precisamos recuperar a confiança. E é aqui que a psicoeducação entra. Como diz António Damásio: “se não houver educação maciça, os seres humanos vão matar-se uns aos outros”. É da psicoeducação que ele está a falar.

Só através dela é possível compreender e aceitar tanto a nós como aos outros. E desejavelmente aprender que é melhor partilhar com todos, do que ficar com tudo. E que a maior vitória não é vencer, é pertencer.

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