Tropecei na música de Joana Espadinha na Antena 3, quando passava o single Pensa Bem, do seu segundo álbum O Material Tem Sempre Razão, lançado em 2018 pela Valentim de Carvalho. Quando chego ao YouTube, vejo um videoclip passado numa festa popular e, acto contínuo, associo à pop de Lena d’Água: algo em mim recuava no tempo e trazia memórias de outro lugar, numa sonoridade muito familiar, que fica de imediato no ouvido.
Numa rápida pesquisa, cheguei à sua participação no Festival da Canção 2018 com Zero a Zero, desconhecendo este facto por não ter assistido às eliminatórias e final. É aí que percebo que a letra e música são de Benjamim (que aliás toca quase tudo ali) e me rendo aos sintetizadores e à sedutora voz de Espadinha.
Decido então entrar neste álbum, correndo-o de uma ponta à outra. Reparo que Benjamim é responsável pela produção de algumas músicas, empresta um toque redondo e completo às melodias. Viajo por sons poderosos, quase tudo atinge um nível muito bom, perfeita suspensão no ar. E deixo-me esmagar por Leva-me a Dançar, com esta letra:
Ah… pára de mentir
No espelho
Com histórias d’encantar
Esquece o que viste na TV
A vida há de mudar
Milagres não vou prometer
No vai-e-vem de ser mulher
Mas se o amor é sério
Leva-me a dançar primeiro
Leva-me a dançar
Mesmo se cair
Quero poder tentar
Amar é nunca ser feliz
O espelho não sabe o que dizer
Milagres não vou prometer
No vai-e-vem de te entender
Mas se o amor é sério
Leva-me a dançar primeiro
Se o amor é sério
Leva-me a dançar primeiro
Leva-me a dançar
Leva-me a dançar primeiro
Leva-me a dançar primeiro
Leva-me a dançar primeiro
Leva-me a dançar primeiro
Começo então a galgar as letras das canções. Falam, grande parte, sobre o amor e desamor, no seu encontro e desencontro habitual, porque vivido a dois, em velocidades diferentes. Sempre com poesia, palavras com muito significado e profundidade.
Leio um pouco sobre a cantora alentejana, apercebo-me das suas influências do jazz. Isso é porventura mais visível no primeiro álbum, onde está mais presa à sua escola e parece não desabrochar tanto como no segundo trabalho. No entanto, em Avesso (2014) dá para entender o seu enorme potencial, com músicas em inglês e português, onde se destaca Ao Seu Dispor e o belíssimo piano de Júlio Resende, entre outros excelentes executantes. É fácil fecharmos os olhos e levitar ao ritmo desta história estranha, onde o tema da solidão está bem explorado.
Joana Espadinha representa a minha geração, muito empurrada para fora do país, à procura de oportunidades de emprego e de afirmação. Conhecer o seu trabalho é, arrisco, entender o potencial dos nascidos no início da década de 80, talvez os últimos herdeiros de um tempo em que a cultura ainda demorava a chegar ou se procurava nos livros. Depois há um salto gigante, numa era de enorme globalização e exigência. São precisas mais vozes assim, em todas as áreas do pensamento e criação. Vidas que ainda sabem bem a diferença e o valor entre o pouco e o demasiado.
No final de Mais uma estrada ouço os Beatles. Acho que estou apaixonado pela Joana, a sua voz é impossível não viciar.