Quando a rede te engole

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A questão da privacidade nas redes sociais é algo que me assusta e que ao mesmo tempo me deixa estupefacta. São longos corredores de possibilidades.
O que são as pessoas capazes de fazer? Tudo.
Até onde conseguem ir para satisfazer os seus instintos destrutivos? A qualquer lado.
Recentemente aconteceu-me um desses casos. A mim e a mais 30, 40, 50 pessoas todas no mesmo caso. Não consigo delinear a dimensão da coisa. Os efeitos foram devastadores. Os danos colaterais ainda não estão sanados  e repercutem-se constantemente.

A arranhar-me o coração, como se de uma porta se tratasse, está o pânico – uma criatura roedora que esgravata.
No facebook censuram a imagem de um mamilo, mas deixam os malucos todos à solta, sem uma trela sequer, um açaime.
Durante demasiado tempo. Cansa, preocupa, e no meu caso em particular acabou por me magoar bastante. Aquilo que somos pode ser destruído por alguém que se esconde constantemente com truques e malabarismos.
O que somos para os outros pode ser abalado por mentiras e dissimulações.

Sinto-me tão amputada pela ausência de liberdade e segurança que mal me conheço. A covardia devia ser punida com algo violento e marcante.

Não façam troça os ridículos, do germe de todos os vícios: a maldade.
A vontade de rir foi substituída pelo desprezo, e o desprezo é silencioso.

Quase sempre, para conseguirmos viver em paz connosco,
mascaramos de cálculos e de sistemas as nossas impotências ou fraquezas: isso satisfaz aquela nossa parte que é, por assim dizer, espectadora da outra. Mas quando chega a hora de calcular as intenções alheias, nenhuma máquina nos ajuda a fazer contas. É como cair num abismo de incerteza. Não conhecemos o inimigo. Esconde-se atrás de um nome falso, de palavras que rasgam a pele de tão afiadas. Deixam cicatrizes e abalam amizades, dilaceram vidas.

Há um extremo da piedade que se confunde com o ódio. A vida é assim mesmo: tem saltos, contrastes, mudanças bruscas, repetições.
Estou habituada a esperar pelos três golpes!
O primeiro golpe fere.
Ao segundo, perguntamo-nos para quê passar pelo mesmo, se para avaliarmos o que suportamos já bastou o primeiro. E ao terceiro golpe, por mais terrível que seja, ficamos apalermados, quase felizes, sem perguntarmos mais nada, e pomos de lado a vida que se serve de nós porque precisa de repetir-se mil vezes antes acertar com o final.
Mas com a nova era tecnológica chegou mais um golpe:
a intrusão na nossa vida. Um fim. Sim, talvez. Mas não, não é um fim, é antes uma falha. E acreditem que chegaria ao outro hemisfério deslizando por uma fenda estreita.
Chego a pensar nisso, sem o dizer, naqueles momentos em que estava dormente pelos ataques numa estreita zona intermédia, apenas com espaço suficiente para nos deixar passar de um lado para o outro, que se abre entre dois mundos.
Quando o dragão interior abre as goelas, é raro que a vítima apanhada na voragem não seja a que lhe convém. A que lhe convém no sentido da destruição.

Não entendo as pessoas que se escondem atrás de perfis falsos e odeio-as ao mesmo tempo. Por vezes não é ódio nem raiva, mas uma espécie de distância súbita no olhar, quando o mundo me parece uma pauta. A estrada do retorno a mim própria é o regresso de um exílio espiritual, porque é a isso que a história de uma pessoa se resume – um exílio.

Preocupar-nos com a nossa auto-imagem, ajustá-la, revê-la, é uma perda de tempo.

Haverá sempre alguém a enferrujar o que construímos. A tornar-nos amargos. Necessário é podermos ser nós sem ter que ser pelos outros. Sermos o que queremos ser e não nos dissolvermos na imagem que os outros olham.
Seremos sempre julgados de qualquer maneira. São todos juízes. São todos carrascos.
São todos os encapuçados ao lado da guilhotina.

Corte-se a cabeça aos que deixaram de ser visíveis há muito tempo!

Lute-se contra a intromissão de dementes na nossa leve sanidade. A criminalidade informática e praticada com recurso a tecnologia informática mantém a tendência de subida. No ano passado registaram-se mais 175 casos de crimes informáticos (de 801 casos em 2016 os registados pelas autoridades em 2017 passaram para 976 casos), o que corresponde ao aumento de 21,8% face a 2016, segundo os dados do Relatório Anual de Segurança Interna de 2017.

Os tolos fazem da moral um bloco compacto e indivisível para que se misture o menos possível com as suas acções e os deixe assim livres em todos os pormenores. Temos que nos proteger constantemente, divulgando o menor número possível de informação online. Não revelar o sítio onde nos encontramos ou até o alterar (truque que me foi ensinado pela experiência amarga durante uma conversa com a PJ). Morada e data de nascimento são dados privados que nunca se devem publicar e por aí fora.

A palavra de ordem é protecção. Protecção e denúncia.

 

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Maria Almeida nasceu e viveu idílicamente na província e quando chegou a Lisboa percebeu que seria difícil sair. Tem um filho de dezanove anos. Escreveu blogs que apagou e dedica-se a ler os outros. Gosta de vinho, música, ler e dormir. É liberal e Delegada de Informação Médica. Sonha com uma quinta no Douro.

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