Os recentes acontecimentos no Sporting indignam-me e assustam-me.
Pela gravidade, mas sobretudo pela normalidade com que o seu presidente nos assegurou, de forma desconcertante e banal que os crimes fazem parte do dia a dia. Que temos de nos habituar e que é chato.
Não é. Nem é chato, nem temos de nos habituar.
Do dia a dia só fazem parte os crimes que nos obrigam à “normalidade” de ter alguns cuidados: evitamos certos sítios a determinadas horas, para que não nos roubem a carteira e fechamos a porta à chave para não sermos assaltados. A “normalidade” do crime num país civilizado e no nosso modo de vida, não passa muito disto. E basta.
Gente que se organiza em hordas – braços armados das claques – esquadrões que invadem com uma facilidade tenebrosa espaços de acesso muito restrito, que conseguem fazer feridos – com ferimentos que podiam ter tido outro desfecho – não, não é normal.
Não é, nem podemos deixar que venha a ser.
Não podemos, nem queremos, ter um polícia armado em cada esquina a proteger-nos, a proteger atletas e jogadores e por isso resta-nos, em conjunto, e como sociedade que ainda tem valores, varrer esta gente da cena desportiva. Limpar clubes, relvados, bastidores e balneários. Tirar-lhes os megafones que incendeiam rastilhos de hostilidades e vinganças.
E ser implacáveis e intolerantes com a intolerância e a violência, tentar salvar urgentemente o que tem de ser o desporto, preservar o espírito que move os seus verdadeiros protagonistas, praticantes e adeptos, com uma vontade mobilizadora que tem de ir para além dos portões dos estádios.
Não sei exatamente como, mas sei que não podemos ignorar.
Se enterrarmos – todos – a cabeça na areia, seremos cúmplices e veremos em breve trocados e alterados para sempre os antigos conceitos e definições de desporto.
O do respeito pelos adversários e o da não-violência, seguramente.
Fotografias © Isabel Santiago